segunda-feira, 21 de maio de 2012

Manifesto por um aprendizado emancipatório

Contemplação / Contemplation / Kontemplation by Cristiano de Jesus

Reflexão sobre a postura (necessária) do estudante diante dos desafios impostos pelo processo de aprendizagem.

As experiências que acumulei durante o tempo que atuo como educador e toda base teórico-filosófica que estudei durante longos e difíceis anos de formação acadêmica, permitem-me identificar ao menos três considerações muito importantes acerca do processo de aprendizagem, quais sejam:

1. Humildade

Não poderia deixar de lembrar de Sócrates, pai da filosofia ocidental, que evocava sua célebre frase "Só sei que nada sei" para demonstrar que uma das principais etapas para alcançar o saber é conhecer sua própria ignorância. Podemos saber muitas coisas mas não sabemos tudo. Muitas vezes nos são colocados desafios aparentemente desnecessários. Todavia, quem somos nós para decretar a inutilidade de uma certa competência ou habilidade? Antes de fazer isso, é uma tarefa muito apropriada responder ... quantos anos de vivência pessoal, acadêmica e profissional experimentei para defender tal afirmação tão seguramente? Quais argumentos eu posso elencar com tamanha segurança a ponto de confronta-los e sustenta-los até o fim diante de um mundo de posições contrárias? Em pleno século XXI, na era da informação, cuja comunicação com pessoas experientes, cujo acesso a teses e proposições, quase não encontram barreiras, seria esse um empreendimento justo e sincero ou pura teimosia?

2. Convicção

Sim, é necessária a convicção de que, mesmo que tudo conspire para o contrário - distrações, diversão, cansaço, e outros - perseverança, concentração e foco são elementos fundamentais para o aprendizado. Eu lembro da importante lição que Platão deixou com o seu "Mito da Caverna" em que pessoas que nasciam e viviam em uma certa caverna não conseguiam compreender nada que não fossem sombras projetadas nas paredes. Essas sombras eram a "realidade" dessas pessoas. Quando alguém oriundo do mundo externo tentava liberta-los, dois obstáculos quase intransponíveis se impunham: primeiro, a resistência em se por a entender algo além das sombras, e segundo, a preguiça, visto que é necessário esforço, também movimento e energia para sair da caverna - são trechos com rochas a serem escaladas, curvas, bifurcações que induzem ao erro e ao retrabalho, e muitos outros desafios. Não há atalhos para o aprendizado! Ele é possível somente pela ação firme em direção ao objetivo.

3. Seleção

O velho Comte estava errado em querer justificar a divisão social de classes pelo conceito darwinista de "seleção natural", entretanto a vida impõe um certo mecanismo de seleção, não radical e determinista como queria Comte, mas há sim em curso contínuo uma dinâmica social que impõe regras que tendenciam as pessoas ao sucesso ou ao fracasso. Abro um parêntese aqui para afirmar que esse "sucesso" o qual me refiro não se trata do sucesso econômico, mas sim do sucesso existencial humanista que está relacionado com o quanto conseguimos desenvolver, durante nossas vidas, do potencial intelectual e criativo que sempre tivemos, e sobre como conseguimos converter esse desenvolvimento pessoal e individual em contribuições para gerações futuras. Eu defendo que é na sensação de realização que encontramos a sensação de felicidade. Fechado o parêntese, passo a contar uma estória que ouvi certa vez e acredito poder esclarecer muita coisa sobre a missão do professor quase inalcançável de conduzir todos seus pupilos. A estória afirma que em uma certa região litorânea em uma certa época do ano, quando a maré subia trazia consigo uma imensa quantia de estrelas do mar que ficavam na areia quando a maré recuava. Triste destino desses animais que encontravam ali o seu fim por não conseguirem voltar ao mar. Numa noite, um jovem, desses muito seguros de si, caminhava pela praia quando viu um ancião pegar com as mãos estrela por estrela e lança-las em direção ao mar. O jovem achou estranho tal comportamento e inquiriu: - senhor, o que adianta esse trabalho? Há aqui talvez milhares de estrelas! Que diferença faz esse esforço todo? O velho, com tranquilidade respondeu: - pra essas estrelas que estou devolvendo ao mar, o meu esforço faz toda diferença! Eu vejo muito da missão do professor no trabalho desse velho. Obviamente que não podemos ajudar a todos, mas àqueles que conseguimos tocar podemos fazer muita diferença. Anualmente eu vejo uma legião de novos estudantes chegando as universidades e poucos saindo. Claro que há inúmeros imprevistos que nos impossibilitam de seguir em frente, mas a maioria daqueles que desistem não podem atribuir senão a si mesmos o seu fracasso. No início da minha carreira docente isso angustiava-me imensamente, hoje vejo com serenidade que a libertação da caverna escura para o deslumbre da luz é para poucos.

4 comentários:

  1. Boa tarde Cristiano.

    Muito legal o seu texto. Já vi isso em muitos colegas do tempo de faculdade.

    Só uma correção no texto (ou talvez não, pode ser que seja proposital) mas voce escreveu "seleção natual" não estaria faltando o "r"??

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Valeu Joâo! Obrigado pelo comentário e pelo alerta do erro de digitação! Um forte abraço!

      Excluir
  2. Sábias e belas palavras!
    Obrigada professor!

    ResponderExcluir
  3. William Hill Betting Locations | Mapyro
    Find William Hill sports betting locations in Maryland, jancasino West 1xbet korean Virginia, Indiana, Pennsylvania, South deccasino Dakota, West casinosites.one Virginia 출장마사지 and more. BetRivers.com.

    ResponderExcluir